Crônica de um cliente: a luta por um tratamento oncológico
Por: Carolina Monteiro
CEO Founder do CX Hub
_______________________________________
Marina era uma mulher ativa, executiva em ascensão na carreira, com 2 filhos. No auge dos seus 45 anos desdobrava-se entre trabalho e família e acabava tendo pouco tempo para cuidar da saúde.
Era 12 de outubro e, enquanto passava um dia prazeroso com os filhos, assistiu na televisão um comercial da campanha sobre o câncer de mama. Lembrou que nunca havia feito antes, pois achava que, no fundo, aquelas coisas só aconteciam com os outros. Antes de dormir foi então para frente do espelho e resolveu fazer o autoexame.
Executou os passos sinalizados e teve uma surpresa: sentiu um nódulo estranho, que ela não tinha percebido antes. Passou a noite grilada e, apesar da vida atribulada conseguiu marcar uma consulta com a sua médica na mesma semana. Ela identificou que Marina realmente tinha um nódulo suspeito e então lhe encaminhou para fazer diversos exames.
Na consulta de retorno a médica constatou: Marina, você vai precisar ser forte: você está com câncer, você tem dois nódulos no seio esquerdo.
Naquele momento, um turbilhão de pensamentos passou pela sua cabeça. Seus filhos, de 10 e 12 anos. O fato de estar sozinha, pois havia se separado recentemente. Sua carreira. O fato de ser a provedora da casa. Sua cabeça girava e ela ainda tentava assimilar a informação.
Soube então que seria necessária uma cirurgia para retirar os dois nódulos identificados no exame e a retirada parcial da mama esquerda.
Foi quando seu mundo desmoronou. Saiu do consultório com as pernas bambas. Ligou para sua mãe e contou aos prantos a notícia. Ao chegar em casa, ela já a aguardava com seus filhos.
A informação baqueou toda a família que ficou extremamente abalada e preocupada com o seu estado de saúde.
O agendamento da cirurgia foi rápido e tudo transcorreu bem. Todos estavam aliviados.
Mas a sua jornada não acabava aí.
Foi encaminhada para um oncologista e ele passou então o novo tratamento: quatro sessões de quimioterapia a cada 21 dias. E possivelmente, sessões de radioterapia logo em seguida.
Com o laudo em mãos, procurou seu plano de saúde para vencer a doença. Estava certa de que seria duro enfrentar tudo isso, mas com o apoio da sua família e a presença de uma força que não imaginava ter, tudo daria certo.
Mas Marina não contava com uma coisa: a burocracia.
Entrou em contato com a sua operadora de saúde e o prazo para retorno da liberação era de até 21 dias úteis. “21 dias úteis!” – ela falou. “Mas estou com uma doença grave, não quero esperar tanto tempo, ela pode evoluir! Vocês vão ter que liberar de qualquer jeito, para que esperar tanto?”.
A operadora explicou que esse era o prazo máximo autorizado pela agência reguladora e que ela deveria esperar o retorno, pois havia uma fila de casos que tinham que passar por análise, mas que a liberação poderia com sorte ocorrer antes.
Sem outra alternativa Marina esperou. E lá se foram 21 dias úteis de pesadelos diários, crises de depressão e a sensação de que podia perder a batalha. Aquela força interior inicial parecia estar abandonando-a.
Concluído o prazo de espera, o tratamento foi liberado, como de praxe.
Após todo o ciclo de quimioterapia, de radioterapia, após ficar careca e entrar numa crise complicada de depressão, Marina teve alta, um diagnóstico promissor, mas teria que continuar a ser acompanhada por 5 anos.
Logo após a sua alta colocou a cabeça no travesseiro, mais tranquila. Naquela noite, a família fez uma festa surpresa e seus dois filhos dormiram abraçados com ela. Ela, no entanto, não conseguia descansar pensando em como seria a vida deles caso ela não vencesse a batalha. Ficou divagando inconformada com todo o estresse que teve que passar para que pudesse iniciar o seu tratamento e o porquê de as coisas terem que ser desse jeito, sempre burocráticas.
Cansada de tanto pensar e não achar as respostas, virou pro lado e finalmente dormiu.
O QUE PODEMOS APRENDER COM ESSE CASO?
- O plano de saúde, tomado pelas suas burocracias internas, não se colocou no lugar do cliente. Não teve a compaixão necessária para agilizar a situação e resolvê-la de forma rápida e menos burocrática. A agência reguladora prevê 21 dias úteis de retorno em casos complexos, mas em casos como o de Marina, será que essa premissa poderia ser revista pela própria operadora? Independentemente de leis?
- Se construíssemos um mapa da jornada desse cliente, seria fácil perceber que a empresa estava mais preocupada em lidar com seus trâmites operacionais do que entender a emoção do cliente.
- Empresas que trabalham centradas no cliente teriam uma melhor percepção da situação e processos e operações bem definidos para esse tipo de caso. Poderiam, não apenas lidar com a situação de forma mais ágil como também ter a oportunidade criar uma experiência memorável, mesmo em uma situação ruim.
- Fazer o mapa da jornada do seu cliente pela perspectiva dele e não pela da sua empresa, exaltando a o bem-estar e não a operação burocrática, garantiria clientes leais, boca-a-boca positivo e evitaria multas desnecessárias.
- Empresas que têm a sua missão e valores bem definidos e conseguem transmiti-los por toda a organização, têm mais chances de serem bem-sucedidas, gerarem mais retenção, satisfação, lealdade e, consequentemente, rentabilidade a longo prazo.
- Esse é o tipo de situação que precisa ser resolvida pelo board da companhia. Discutida e analisada para que toda a cadeia seja mudada. Os colaboradores que ficam na linha de frente, embora passem diariamente por situações relacionadas a esse tipo de decisão, as quais não tem controle, passam por momentos de estresse sem que ninguém esteja preocupado com a sua experiência também.

Carolina Monteiro
CEO Founder do CX Hub
Com mais de 17 anos de experiência em marketing, atuou nos últimos quatro anos como gerente de Customer Experience na Amil (United HealthGroup Brasil) quando se especializou na construção de estratégias para melhoria da experiência do cliente com foco em produtos, processos, serviços e pessoas.É graduada em Comunicação Social, com ênfase em Publicidade e Propaganda e Jornalismo pela PUC-Rio, e possui MBA em Marketing pelo COPPEAD- UFRJ.
É certificada em: Customer Experience Management pelo Medallia Institute, EUA; NPS 2.0 pelo Satmetrix, EUA, Marketing de Relacionamento pelo Ibmec; Leadership Excellence, Disney Institute, EUA; CX Summit, Disney Institute, 2017.
Comentários